quarta-feira, 22 de julho de 2009

Honduras e você, tudo a ver




Começo este artigo com uma obviedade: minha mulher é muitíssimo mais inteligente do que eu, em todos os aspectos. Quando quero escrever alguma coisa sobre um determinado tema, é dela que tiro, sempre, dois insumos fundamentais antes de sentar-me frente ao teclado: se o assunto não corre o risco de ser vítima da minha pieguice (ela é implacável) e qual o verdadeiro cerne, qual a síntese do que realmente desejo dizer. Em muitos casos, acabo não escrevendo. Em outros, escrevo com a cautela de quem deseja realmente ser lido por seres humanos normais, tudo graças à prudência que ela me inocula. No entanto, a patroa entra sempre com o que me falta: serenidade nas 24 horas do dia. Hoje de manhã, esta serenidade entrou em ação e me derrubou o queixo novamente.

Comentava com ela o "dilema" de Honduras, do presidente deposto por um grupo liderado por militares porque teria descumprido a constituição do país. Minha dúvida residia em qual lado me posicionar. É óbvio que golpe militar é deplorável sempre. Também repudio as molecagens de algumas figurinhas latino-americanas, como Hugo Chávez e Evo Morales, que transformam a lei de seus países em cartilha ideológica e seus governos em ditaduras disfarçadas.

A questão é: quem está com a razão? O presidente deposto ao exigir seu retorno ou os militares que o depuseram alegando a defesa das instituições democráticas?

Minha esposa, a quem fiz a pergunta acima, respondeu certeira:

- Para nós, brasileiros e latinos, é uma pergunta difícil e a resposta, no entanto, está na crise ética que assola a todos, em especial a América Latina. A razão está, de novo, no desrespeito à lei, resultado de lacunas éticas e morais às quais somos submetidos. Se a constituição do país foi desrespeitada, quem a desrespeitou foi punido. Se o instituto da reeleição em Honduras é vedado aos governantes, então não pode haver reeleição. E se na constituição diz que perderá o cargo quem tentar de modo espúrio levantar o assunto, então não pode! Assunto acabado. É que nós achamos que tudo pode e que a lei é uma mera referência que sempre pode ser burlada, relativizada, descumprida. Para nós, brasileiros, hoje em dia tudo é permitido, principalmente na seara pública, onde reina a impunidade.

Ou seja, se levarmos em conta que na constituição hondurenha estava previsto um mecanismo específico para evitar sandices e bolivarices, então ele deveria ter sido obedecido? Para nós, talvez sim, talvez não. Assolados por bizarrices jurídicas, éticas e morais todos os dias, porque não relativizar também a carta magna de um país? Porque não usar os instrumentos da democracia, como uma consulta popular, um referendo, por exemplo, para tentar manter um presidente por 8, 12 anos? Ou, sendo ele "o cara", porque não mantê-lo a vida toda no poder? A resposta dos líderes hondurenhos que depuseram o presidente não pode ser considerada um golpe de estado puro e simples. Eles têm, a favor de si, a defesa necessária da imperiosa necessidade da lei. Certo? Ou não?

Viu como a resposta é difícil?